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eduguim on
04/11/12 • Categorized as Opinião
do blog
Vencidas
as inacreditáveis ingenuidade e imprudência de democratas bem-intencionados que
chegaram a crer que a direita midiática continuaria aceitando ser contrariada
por uma vontade popular que as urnas teimam em expressar eleição após eleição
desde o histórico 2002, é chegada a hora de ler o script do golpe – que já não
se esconde.
Retrocedamos,
pois, ao limiar daquele outono de 1964, quando, já em nome do “combate à
corrupção”, os mesmos meios de comunicação evocavam a “ética” contra o governo
trabalhista de então, que, tenhamos presente, cometia o “crime” de combater a
desigualdade renitente que infecta a nação há 500 anos, só que com muito menos
ousadia do que o atual.
No início
dos anos 1960, o Coeficiente de Gini, que mede a concentração
de renda das nações, em sua versão verde-amarela, já altíssimo, alcançava a
marca pornográfica de 0,52 – quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade.
Aos
trancos e barrancos, no limiar do golpe Jango Goulart retomara, em certa
medida, o controle do governo, após tentativas civilizadas de impedir que
adotasse medidas contra uma chaga nacional que escandalizava o mundo e mantinha
o país agrilhoado ao atraso.
A
expressão “reforma agrária” também escandalizava, só que aos detentores do que,
à época, tinha muito mais importância do que hoje: a propriedade da terra. E,
para colocar lenha na fogueira, os movimentos estudantil e sindical se entregavam,
entre um devaneio e outro, ao idílio socialista. E o que é pior: sem fazer
maior segredo.
Os
arreganhos golpistas, para se venderem à sociedade, não falavam no “direito”
dos ricos a concentrarem parcela indecente da renda. A ideia de que o povo estava
sendo roubado pelo governo justificaria melhor a conspiração que já germinava
nas redações dos donos da “imprensa”.
Era
preciso, pois, construir “razões” para justificar o uso da força bruta a fim de
obter o que, cada vez mais, ficava evidente que não seria obtido pelas urnas –
até porque, na falta de votos, fraudá-las seria impossível estando os
“comunistas” no poder, pois são os governos que organizam eleições.
Dez anos
antes, a mesma desculpa fora usada para acuar aquele que, heresia das heresias,
ousara erigir uma legislação trabalhista que tantos “custos” acarretara ao
“pobre” capital.
A
história do Brasil, como se vê, é a prova de que a “corrupção” sempre foi o
artifício do capital e das elites para manter a esquerda, seu trabalhismo e seu
viés distributivista de renda longe do poder de Estado.
A
pontuação do coeficiente de Gini, naquele outono de 1964, era pouco maior do
que é hoje. Com a ditadura, as coisas foram postas no lugar, ou seja, de 0,52,
naquele momento, ao fim da ditadura foi parar em cerca de 0,60, em um processo
que tornou o rico mais rico e o pobre, mais pobre.
Entre
todas as razões para o golpismo se erguer de novo por estas bandas, portanto, a
queda vertiginosa do Gini que marcou os governos Lula e Dilma explica, como
nada mais, a volta das acusações de corrupção ao grupo político que, no poder,
é responsável por, em dez anos, devolver ao Brasil o que a ditadura levou vinte
para lhe roubar – em 2012, o índice é pouco menor do que o de 1964.
No
entanto, se as razões de hoje para o golpismo via acusações de corrupção ao
governo de turno são as mesmas de há meio século, o script do golpe teve que
ser reescrito. Não existe mais o inimigo externo a ameaçar tomar os bens das
famílias mais abastadas para entregá-los à ralé preguiçosa, morena e inculta.
Sem a
ameaça de tropas vermelhas a marchar sobre a nação, não se justifica mais o uso
das forças armadas para golpear a democracia. É por aí que começou a ser
construída, em Honduras, uma modalidade de golpe que há pouco se reproduziu no
Paraguai de forma mais próxima – porém ainda grosseira – do modelo que se
pretende aplicar por aqui.
O golpe
“constitucional” de Honduras inaugurou a modalidade, o do Paraguai a refinou um
pouco mais, mas ainda não o suficiente para ser usada no Brasil. O ansiedade
por retomar o poder naqueles países pecou pelo tempo escandalosamente curto
para desenvolver o processo.
No
Brasil, com a comunicação de massas, o Judiciário, os militares e boa parte da
classe política de acordo, pode-se dar tempo ao tempo, começando a devorar a
democracia pelas beiradas.
A
aceleração que se está vendo do processo, portanto, deve-se à gota d’água que
foram as eleições de 2012, que extirparam aos golpistas contemporâneos qualquer
esperança em obter do povo a colaboração eleitoral para recolocá-los no poder.
Pela
burrice de que padecem os autoritários, confiaram na “burrice” popular que
acreditaria, por exemplo, em uma revista que há dez anos, semana após semana,
só enxerga e denuncia corrupção em um único partido, em um único nível de
governo. Passada a última surra eleitoral, aplicada bem quando a bomba atômica
(o julgamento do mensalão) foi detonada, não há mais esperança.
A
condenação ditatorial de José Dirceu, José Genoino e outros petistas menos
relevantes não conspurcou nem o PT, nem Lula e muito menos o governo Dilma
Rousseff. Acabaram-se as ilusões.
Assim, o
golpismo destro-midiático descobriu que o povo simplesmente se recusa a
acreditar que o PT inventou a corrupção no país – premissa contida no
fato de petistas serem os primeiros políticos a ser condenados pelo STF após
mais de cem anos de história republicana.
Eis que a
ingenuidade de Lula e de Dilma, quase inacreditável, foi um presente dos deuses
– ou dos demônios – para o golpismo tupiniquim. Lula, um estrategista político
como nunca se viu outro no Brasil, nomeou, de olhos fechados, inimigos
políticos para o cargo que dá a quem ocupa a prerrogativa de processar até o
presidente da República.
Dessa
maneira, há poucas dúvidas – se é que existe alguma – de que o doutor Roberto
Gurgel aceitará, gostosamente, a denúncia que a oposição faz àquele que
responsabiliza por suas derrotas eleitorais, o que ela faz por não entender que
o que leva o povo a votar nos que ele indica não são seus belos olhos, mas a distribuição
de renda e oportunidades.
Os
golpistas mais espertos, então, já sabem que anular Lula será insuficiente
enquanto a vida do brasileiro continuar melhorando. Mesmo que consigam fazer o
processo dele andar até as eleições de 2014, de forma a chegar lá
desmoralizado, a situação do país reelegerá Dilma.
Se mesmo
após Lula ter sido inocentado nas investigações sobre o mensalão agora estão
conseguindo envolvê-lo com matérias meramente opinativas de revistas e
jornais, o que custará “descobrirem”, antes de agosto – quando Gurgel será
substituído –, que a presidente, que integrou o governo anterior, também
integrou a “quadrilha”?