O objetivo do artigo mentiroso publicado por Veja não é a moralidade ou a ética, mas criar condições jurídicas para afastar Lula das eleições de 2014 e 2018.
Por José Carlos Ruy
Aqueles que, credulamente, ainda
pensam que os jornais e revistas do PIG (Partido da Imprensa Golpista)
têm o objetivo de informar e debater questões públicas relevantes
poderem encontrar, na edição desta semana do panfleto direitista chamado
Veja um desmentido para estas esperanças e farto material
pedagógico sobre a maneira como agem. São instrumentos da luta de
classes dos ricos contra os pobres, onde os cães de guarda dos
interesses dominantes investem contra os setores progressistas,
democráticos e nacionalistas num combate político cuja arma é a mentira e
a difamação.
O repórter, autor da matéria, e o diretor da revista afirmam ali,
candidamente, que as graves denúncias feitas contra o ex-presidente Luís
Inácio Lula da Silva estão baseadas no ouvir dizer, em “revelações de
parentes, amigos e associados” do empresário Marcos Valério, que
extravasaria a eles seu inconformismo por sua condenação no processo do
chamado “mensalão”. Acusação ouvida do próprio Marcos Valério - e esse é
o critério não só do bom jornalismo, mas também da boa investigação
criminal - nenhuma! Aliás, o próprio advogado de Marcos Valério, Marcelo
Leonardo, prontamente desmentiu as mentiras da revista da família
Civita e afirmou que seu cliente não conversou com nenhum jornalista.
O artigo calunioso sustenta que Lula teria se encontrado com o
publicitário Marcos Valério, quando presidente da República, para
acertar detalhes do chamado “mensalão”, que envolveria uma quantia muito
maior do que a atribuída no julgamento que ocorre no Supremo Tribunal
Federal, alcançando a quantia de 350 milhões de reais.
Não é a primeira vez que
Veja é pega na mentira, que tem sido a
norma da revista nos últimos anos e não apenas em matérias políticas mas
também em outras áreas. Há um ano, no início de setembro de 2011, ela
divulgou uma matéria de capa sobre um medicamento para diabetes que,
assegurava, levaria seus usuários a emagrecimento em tempo recorde; foi
um escândalo tamanho, de repercussões negativas sobre a saúde pública,
que a Anvisa precisou intervir e obrigar a revista a se desmentir. Os
ecos da matéria mentirosa e da intervenção da Anvisa foram ouvidos
inclusive em academias de ginástica onde pessoas ainda crédulas se
manifestavam indignadas com a irresponsabilidade e as mentiras da
revista.
A série de mentiras é longa; ela envolve, só para lembrar algumas, o
acolhimento das acusações feitas por um bandido contra o ministro do
Esporte Orlando Silva Jr (e, em consequência, contra o PCdoB) ou a
fantasiosa “revelação” de que Lula teria pressionado o ministro Gilmar
Mendes, do STF, pelo adiamento do julgamento do chamado “mensalão”, que
foi imediatamente desmentida pela terceira pessoa que participou do
encontro durante o qual a pressão, o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim.
São antecedentes mentirosos que não contam para os paladinos do
conservadorismo e do neoliberalismo na mídia comercial. Um dos mais
notáveis deles, o comentarista Merval Pereira, de
O Globo, foi logo para o ataque afirmando a possibilidade de uma denúncia contra Lula, com base nas acusações falsas de
Veja. Outros - como Ricardo Noblat - foram na esteira dele, e no mesmo tom.
É a volta do coro conservador e neoliberal, com um objetivo muito claro e
definido. Desde a crise de 2005 estes comentaristas sabem que não
conseguem enganar o povo. Foram derrotados pelo voto popular nas
eleições de 2006 e depois em 2010, e seus partidos e candidatos
enfrentam dificuldades imensas nas eleições municipais desde então. O
PSDB minguou e a voz de seus caciques, ouvidas nos salões chiques de São
Paulo, Rio de Janeiro, Londres ou Nova York, não repercutem mais ali
onde de fato interessa: no meio do povo, que vota e escolhe os
governantes.
A tática que parecem adotar, perante este quadro de dificuldades
eleitorais para seu renegado programa neoliberal e para aqueles que o
representam, é tentar inviabilizar juridicamente uma nova candidatura de
Luís Inácio Lula da Silva à presidência da República, em 2014 ou 2018.
Para aqueles que aceitavam apenas um mandato para Lula - o primeiro, de
2003 2006 - o quadro que se apresenta é politicamente aterrador ao
indicar a quase inexorável perspectiva de um domínio de mais de vinte
anos das forças democráticas, progressistas e patrióticas sobre a
presidência da República.
Daí a ideia “genial”: condenar Lula como o chefe do chamado “mensalão” e
ganhar, no tapetão, aquilo que não conseguem alcançar no voto, a
exclusão do líder sindical e operário de futuras disputas eleitorais.
É difícil que tenham êxito, como mostra a reticência dos presidentes dos
dois principais partidos da direita neoliberal -- o PSDB e o DEM --,
Sérgio Guerra e José Agripino, diante de qualquer iniciativa jurídica
contra Lula a partir de bases tão frágeis quanto a mentira relatada por
Veja.
A luta é política; é luta de classes, e a direita (com seus cães de
guarda da mídia) investe - nunca é demais repetir - na única e
esfarrapada bandeira que alega sustentar, a defesa da moral e da ética. O
caráter mentiroso dessa defesa fica claramente exposto quando se vê o
comportamento dessa mesma mídia diante de acusações mais graves e
sólidas contra o tucanato e seus governos, como se viu no eloquente
silêncio a respeito das denúncias feitas no livro Privataria Tucana, no
qual o jornalista Amaury Ribeiro Júnior denuncia as falcatruas do
governo de Fernando Henrique Cardoso, ou diante do acúmulo de denúncias
do envolvimento do jornalista Policarpo Jr, diretor de
Veja em
Brasília, com a quadrilha de Carlinhos Cachoeira. Para a mídia e para os
tucanos o objetivo não é alegada moralidade mas a criação de condições
para sua volta ao poder. Como se fosse possível no Brasil de hoje!
O poder da mídia conservadora é inegável, e grande. É o poder da classe
dominante brasileira, fortalecido inclusive com contribuições do próprio
governo federal. Dados divulgados na semana passada pela Secretaria de
Comunicação Social da Presidência da República mostram que, dos 161
milhões de reais gastos em publicidade desde o início do governo de
Dilma Rousseff, 50 milhões foram apenas para a TV Globo; a Editora Abril
recebeu 1,6 milhões (1,3 milhões para publicidade em revistas e 300 mil
na internet).
Esse poder se defronta hoje com um protagonismo popular mais acentuado;
os velhos “formadores de opinião” claudicam ante o despertar do povo
brasileiro e, sem propostas claras e objetivas, amparam-se em mentiras e
na calúnia. Precisam olhar a história: em batalha semelhante, na década
de 1950, a mídia conservadora e antidemocrática investiu contra o
presidente Getúlio Vargas com a mesma fúria com que hoje ataca as mesmas
forças democráticas, progressistas e patrióticas que dirigem o governo
federal. O fracasso daquela investida ficou clara na derrocada da
principal revista daquela época,
O Cruzeiro, notável pela mesma capacidade de mentir e caluniar hoje protagonizada por
Veja. Em outubro de 1954, logo depois do suicídio de Vargas, a tiragem de
O Cruzeiro ainda
era de 700 mil exemplares; poucos meses depois, em fevereiro de 1955,
caiu para 660 mil e seguiu em queda livre até 1965, quando ficou na
faixa dos 400 mil exemplares, e continuou caindo (os dados estão num
livro cujo título é apropriado:
Cobras Criadas: David Nasser e O Cruzeiro, do jornalista Luiz Maklouf Carvalho).
A direita e os conservadores precisaram de um golpe militar, em 1964,
para impor suas teses e massacrar a democracia que se fortalecia.
Os tempos mudaram e a direita, hoje, mantém o poder do dinheiro e da
mídia mas perdeu a capacidade de mobilização popular e de respaldo dos
quartéis para seus projetos anacrônicos, antidemocráticos e
antipatrióticos. Restam a ela, como armas, a mentira e a mistificação.