Fonte: Agência Diap
Antônio A. de Queiróz
A atualização salarial em 2010 obedece a três ordens de restrições: 1) relacionada à disputa eleitoral; 2) ao término dos mandatos dos titulares de poder; e 3) de natureza orçamentária
Em resposta a consultas de entidades de servidores públicos federais, preocupadas com as limitações das leis - Eleitoral, de Responsabilidade Fiscal (LRF) e de Diretrizes Orçamentária (LDO) - quanto ao prazo a partir do qual é proibido promover atualização de salário, o DIAP resolveu elaborar um rápido esclarecimento acerca da matéria.
É preciso, desde logo, ficar claro que toda e qualquer atualização salarial, exceto a revisão geral anual, terá que estar de acordo com os limites fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal, segundo os quais:
1) A União poderá gastar 50% da receita corrente líquida, distribuídos entre Poder Legislativo, incluindo o Tribunal de Contas da União (2,50%), Poder Judiciário (6%), Ministério Público da União (0,60%), Distrito Federal e Territórios (3%), Poder Executivo (37,90%).
2) Os estados poderão gastar até 60% da receita líquida corrente, assim distribuída: Poder Legislativo, incluído o Tribunal de Contas (3%), Poder Judiciário (6%), Ministério Público (2%), Poder Executivo (49%);
3) Os municípios poderão gastar até 60% da receita corrente líquida, assim distribuídos: Poder Legislativo, incluído o Tribunal de Contas (6%) e o Poder Executivo (54%).
Restrições
É necessário esclarecer que a atualização salarial em 2010 obedece a três ordens de restrições: uma relacionada à disputa eleitoral; outra ao término dos mandatos dos titulares de poder; e a última de natureza orçamentária.
A primeira restrição, de natureza moral, prevista na Lei 9.504/97, veda condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos, como a concessão de reajustes salariais superiores à inflação do ano da eleição nos 180 dias antes do pleito eleitoral (a partir de 6 de abril de 2010).
A segunda restrição, relativa ao controle das finanças públicas para evitar aumento de despesa permanente para o futuro administrador, prevista na Lei Complementar 101/00 (LRF), torna nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal nos 180 dias que antecedem ao término do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão, mesmo que o aumento vá vigorar em data futura.
A terceira restrição, de natureza orçamentária, prevista na Lei 12.017/09 (LDO para 2010), só permite reajuste em 2010 para os servidores cujo projeto ou medida provisória prevendo o aumento tenha iniciado sua tramitação no Congresso até 31 de agosto de 2009.
Vamos a analise de cada uma dessas três situações.
A Lei Eleitoral (9.504/97), conforme transcrito abaixo, no inciso VIII de seu artigo 73, trata de revisão geral ou da data-base dos servidores, já regulamentada pela Lei 10.331/01, segundo o previsto no artigo 37, inciso X, da Constituição Federal.
Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.
(Art. 7º, § 1º: cento e oitenta dias antes das eleições).
A Lei Eleitoral, como se vê, proíbe, nos 180 dias anteriores ao pleito, apenas a revisão geral que exceda a reposição da inflação do ano da eleição.
No entanto, não impede a revisão geral anual, prevista o inciso X do artigo 37 da Constituição, desde que esta não exceda a recomposição do poder aquisitivo, nem tampouco veda transformação, alteração de estrutura de carreiras ou reclassificação de cargos, incluindo a concessão de qualquer vantagem a grupos específicos de servidores, desde que observado o mesmo princípio, ou seja, o aumento não pode superar a inflação do ano em curso.
Quanto à Lei de Responsabilidade Fiscal, (Lei Complementar 101/2000), conforme transcrito abaixo, em seu artigo 21, torna nulo o aumento com despesa de pessoal nos 180 dias que antecedem ao término do mandato do titular do respectivo poder.
Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000:
Art. 21 - é nulo de pleito direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda:
I - as exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar, e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no parágrafo 1º do art. 169 da Constituição;
II - o limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo;
Parágrafo Único - Também é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento de despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no artigo 20. (grifo nosso)
A Lei de Responsabilidade Fiscal, no parágrafo único do artigo 21, de fato impõe restrição temporal em ano eleitoral para efeito de aumento de despesa permanente de pessoal, proibindo qualquer modalidade de reajuste nos 180 dias que antecedem ao término do mandato.
Se a Lei de Responsabilidade Fiscal fosse levada ao pé da letra, os prazos para revisão remuneratória para 2010 seriam distintos para cada um dos poderes.
O Poder Executivo, cujo mandato do titular (presidente da República) termina no dia 31 de dezembro, o prazo fatal seria 5 de julho.
No Poder Legislativo, onde os mandatos dos parlamentares e dos presidentes das duas Casas só se encerram em 31 de janeiro, o prazo fatal seria 5 de agosto. E, no caso do Judiciário, cujo mandato do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) se encerra em 23 de abril de 2010, o prazo fatal teria sido em novembro de 2009.
Entretanto, não é bem assim que funciona. Existem vários precedentes, entre eles a Lei 11.416, de 15 de dezembro de 2006, oriundo do Supremo Tribunal Federal, que tratou do plano de carreira dos servidores do Judiciário, aprovada em ano eleitoral e apenas a quatro meses do término do mandato do então presidente do STF e 16 dias do término do mandato do presidente da República.
O último óbice à concessão de reajuste em 2010, e não se vincula ao período eleitoral, é a exigência contida na Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2010, a Lei 12.017/2009, que, segundo parágrafo 1º do seu artigo 82, estabelece que o aumento da despesa com pessoal só será autorizada se o projeto ou medida provisório tiver iniciado a tramitação no Congresso até 31 de agosto de 2009.
Lei 12.017, de 12 de agosto de 2009:
Art. 82. Para fins de atendimento ao disposto no art. 169, § 1º, inciso II, da Constituição, observado o inciso I do mesmo parágrafo, ficam autorizadas as despesas com pessoal relativas a concessões de quaisquer vantagens, aumentos de remuneração, criação de cargos, empregos e funções, alterações de estrutura de carreiras, bem como admissões ou contratações a qualquer título, até o montante das quantidades e limites orçamentários constantes de anexo discriminativo específico da Lei Orçamentária de 2010, cujos valores deverão constar da programação orçamentária e ser compatíveis com os limites da Lei Complementar 101, de 2000.
§ 1º O Anexo a que se refere o caput conterá autorização somente quando amparada por projeto de lei ou medida provisória, cuja tramitação seja iniciada no Congresso Nacional até 31 de agosto de 2009, e terá os limites orçamentários correspondentes discriminados, por Poder e Ministério Público da União e, quando for o caso, por órgão referido no art. 20 da Lei Complementar 101, de 2000.
Essa regra, inaugurada na LDO de 2007 para 2008, por intermédio do parágrafo 1º do artigo 84 da Lei 11.514/07, e repetida na LDO para 2009, foi incluída pelo Ministério do Planejamento para impedir que carreiras do serviço público pudessem arrancar reajustes sem previsão orçamentária, exigindo o envio de projeto ou medida provisória até o prazo limite da remessa ao Congresso Nacional da proposta orçamentária para o ano seguinte: 31 de agosto do ano em curso.
Em conclusão, como não se trata de revisão geral, pode-se afirmar que só terão reajuste em 2010, salvo alteração na LDO ou lei anteriormente aprovada, os servidores cuja proposição prevendo esse ganho tenha iniciado sua tramitação no Congresso até 31 de agosto de 2009. No caso dos Poderes Executivo e Legislativo, cujos titulares estão prestes a vencer os mandatos, seja transformada em lei ou convertida em MP até, respectivamente, 5 de julho e 5 de agosto de 2010.
Para 2011, por força da exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, as proposições prevendo atualização salarial deverão ser encaminhadas até 5 de julho de 2010, no caso do Executivo; até 5 de agosto, no caso do Legislativo, e, no caso do Judiciário, como o mandato do próximo presidente se inicia em 15 de abril, o prazo seria 31 de agosto de 2010, mas em função da Lei de Diretrizes Orçamentária e em razão da Lei de Responsabilidade Fiscal.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap
(**) Publicado originalmente em 9/02. Em razão de várias observações feitas ao autor, o artigo é republicado com correções e ampliações